27 de agosto de 2015

Por que estamos quase sempre distraídos?


Tommaso Russo

Se seu trabalho depende em conseguir algum tempo sem interrupções para se concentrar em um problema importante ou para desenvolver algum tipo de atividade criativa, é bastante provável que você saiba tudo sobre essa praga moderna que é a distração. O que as pessoas talvez não percebam é que não sabem o que a distração realmente é – e esclarecer essa confusão é o passo inicial para termos alguma esperança numa solução definitiva para o problema.

Institivamente, dividimos as fontes de distração em duas categorias. Primeiro, há as tentações: quando alguém se concentra num desafio intelectual, a ideia de alguns minutos no Facebook para relaxar – ou dar uma escapada para um café no bar mais próximo – pode ser irresistível. Em segundo lugar, existem as interrupções: o colega que não para de interrompê-lo com perguntas, e-mails inúteis chegando às dezenas em sua Caixa de Entrada ou a discussão acalorada que seu vizinho de mesa trava com um cliente pelo viva-voz do celular.

Quando pensamos em termos de tentações e interrupções, sempre assumimos que o problema tem sua origem em fatores externos – assim, faz sentido tentar eliminá-los fechando o navegador da internet, usando fones de ouvido, mandando os colegas inconvenientes passear ou fugindo para uma pousada no meio do mato. Mas existe uma razão pela qual esses métodos não funcionam bem ou não funcionam por muito tempo. A causa real não são as irritações externas, mas sim uma urgência interna em desviar nosso foco nas coisas realmente importantes. Ou seja, na verdade, queremos ser distraídos.

Ninguém diagnosticou esse problema tão brilhantemente quanto Friedrich Nietzsche, o mal-humorado filósofo alemão do século 19, que discutiu na obra Considerações Extemporâneas que buscamos distrações para mantermo-nos mentalmente ocupados, pois assim evitamos encarar as grandes questões – como, por exemplo, se nossas vidas têm significado. Tuitamos, clicamos e mergulhamos em discussões nas redes sociais porque “enquanto estamos sozinhos e quietos, temos medo que algo seja soprado em nossos ouvidos”. Pior ainda, até o trabalho que parece produtivo pode ser de fato uma forma de distração, se nos impede de pensar o que o mais importante. “A maneira pela qual nos dedicamos ao nosso trabalho diário de forma mais intensa e cega do que seria necessário”, Nietzsche escreveu, é “porque é ainda mais necessário não ter nenhum tempo livre para parar e pensar. A pressa é algo universal, porque todos estão fugindo de si mesmos”.

Por que evitamos tão bravamente focar-nos no que é realmente crítico? Um motivo, de acordo com alguns estudos psicológicos, é que possuímos uma ânsia desesperada pela autonomia, ou seja, pelo controle de nossas próprias vidas. Como resultado, resistimos a tudo que nos foi pedido (ou ordenado) fazer – mesmo que estejamos obedecendo a nós mesmos. Assim, você planeja fazer seu plano de negócios ou escrever o próximo capítulo do seu livro na próxima quarta-feira bem cedinho…mas quando a quarta-feira chega, você se revolta contra o feitor que mandou você trabalhar, e começa a trocar mensagens pelo Whatsapp – só para mostrar quem manda. Parabéns, você é um rebelde – mas, infelizmente, são seus próprios objetivos que estão sendo sabotados.

Existe uma razão ainda mais profunda para buscar a distração, no entanto: encarar nossas grandes questões existenciais dá medo, muito medo. Você pode querer eliminar todas as distrações e concentrar-se. Mas e se, na hora em que a quietude e paz mental é finalmente alcançada, você percebe que a empresa que você fundou não é mais algo de que você queira fazer parte? Ou o app que você escreveu e do qual tem tanto orgulho está provavelmente tornando a vida dos outros um pouco pior? Ou que sua trajetória de carreira afastou você de seus valores mais profundos? A vida é curta e essas questões são dolorosamente urgentes. Não é de se admirar que preferimos nos afundar nas redes sociais ou alguma outra coisa igualmente alienante – quem optaria por mergulhar deliberadamente numa crise existencial?

A boa notícia é que quando você enxerga a distração como ela é na realidade, estará mais bem equipado para combatê-la. Fones de ouvido e desligar os avisos de novas mensagens na caixa de entrada ajudam bastante. Mas é preciso detectar o movimento em seu interior no sentido da distração e, quando ele aparecer, não se culpe ou lute para esmagá-lo. Apenas tome ciência do que está acontecendo, respire fundo e espere que desapareça. Lembre-se também que não é preciso “estar motivado” para fazer um trabalho importante. Ao invés, imagine-se fazendo qualquer outra coisa e, ao mesmo tempo, faça o trabalho: abra seu laptop, faça aquela ligação, digite mais uma frase.

Acima de tudo, reserve tempo para pensar em você mesmo. É um meio comprovado de assegurar que você está lidando com as grandes questões de sua vida. Na medida em que esses problemas são arejados com regularidade, eles perdem cada vez mais seu caráter tóxico e que a urgência em distrair-se para fugir deles vai diminuindo também. Você pode chegar à conclusão que é tempo de dar uma virada em sua vida. Entretanto, se isso vai realmente acontecer ou não, você terá uma probabilidade bem menor de ser arrastado para fora do curso agora. É possível também que você descubra que as tentações e interrupções externas irão aborrecê-lo cada vez menos. A distração é uma produção interna, felizmente. Significa que não há necessidade de eliminar todos as perturbações externas (ou seja, aguardar o Apocalipse) antes de ser possível focar naquilo que realmente importa.

Adaptado de Why Are We so Distracted All the Time?, publicado em http://99u.com/articles/51300/why-are-we-so-distracted-all-the-time

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